A Presença – Gabriel Antoun

A Presença

Gabriel Antoun

Já conferi a porta trancada inúmeras vezes e ainda assim não me sinto seguro. A chuva que cai lá fora não ajuda em nada na tentativa de criar um ambiente menos assustador. Deixo as luzes do quarto acesas e depois de 3 copos de whisky deito para me acalmar. Mas porque me sinto inquieto? Não tem mais ninguém comigo. Ou será que… CRAASHK… o que foi isso? Um barulho de madeira se rompendo veio da sala no primeiro andar. Mas como? Será que caiu algum coisa? Ou será que veio lá de fora? Não, não pode ser. Impossível um barulho de fora da casa ter soado tão alto e nítido. Deve ser o efeito do whisky. Melhor eu ir ver o que houve. Será? Como eu acho coragem para deixar o único cômodo iluminado, atravessar o corredor e descer as escadas na penumbra? Mas porque o medo? Não é ninguém! As portas foram trancadas, tenho certeza. Verifiquei diversas vezes…CRAASHK.. Outra vez?!?! Mais perto agora! Definitivamente não veio lá de fora. E mesmo que eu tivesse secado a garrafa, nenhum whisky, por mais barato que seja, me faria ouvir sons que não existem. Né? Seja lá quem for está dentro da casa e parece estar subindo as escadas, vindo para cá. Um pensamento horrível passa pela minha cabeça: E se a pergunta não for QUEM e sim O QUE está causando esse ruído? Devo perguntar quem é? Isso me denunciaria. Mas a luz acesa do quarto já me denunciou e guiou essa coisa até aqui. – Quem tá aí? Sem resposta. – Quem tá aí? Responde! Silencio novamente. É impressão minha ou… rashc rashc rashc… Algo se arrastando pelo chão do corredor. – Tem alguem aí? Minha voz já trêmula. Ninguém responde. Começo a acreditar que a pergunta definitivamente está errada. Mas será que de fato tem alguma coisa se aproximando, rastejando pelo chão do corredor? rashc rashc rashc… não é possível! Ouvi muito claramente agora. Alguma coisa ESTÁ ali, a menos de 10m de distancia do quarto. Se aproximando…aproximando. Levanto num pulo e fecho a porta do quarto com pressa e força já totalmente tomado de terror. Até onde a luz do quarto podia iluminar a corredor não vi nada. De qualquer forma, tranco também a porta do quarto. TUF… quase que imediatamente após girar a chave ouço um ruído surdo e abafado, como algo pesado se chocando contra uma superfície acarpetada, logo no base da porta em frente a mim. Calma, a porta está trancada! Seja o que for não vai conseguir entrar. Chego bem próximo e ouço…ouço uma.. respiração? Seria eu mesmo? Não.. não sou eu… dou um salto para trás quando vejo (ou imagino) a porta vibrar levemente, como se alguma coisa testasse o trinco e tentasse forçar a entrada. Corro para a mesa de cabeceira em busca do revolver que guardo na gaveta. Quando se mora sozinho em uma casa afastada é necessário criar seus próprios sistemas de segurança. Mas… eu não estou sozinho. Não agora. Ou estou? Não…tem mais alguma coisa ali do outro lado da porta. Ou algumas. Eu posso sentir a presença. A porta vibra novamente e eu involuntariamente aponto a arma naquela direção. Sinto algo gelado tocar meu ombro esquerdo. Me viro de forma brusca, com a arma em punho. A mira já tremia de tal forma que seria impossível acertar alvo qualquer. Não tem nada ali. Mas eu senti, porra! A porta vibra novamente atraindo a cano do meu revolver. Mais forte agora. Sons de respiração mais altos. Sinto o toque gelado de novo no meu ombro. Me viro novamente. Meu revolver dançava pelo ar sem focalizar em nenhum alvo especifico. Quase disparo com o susto que levei ao ver meu próprio reflexo no espelho. Porque estou temendo pela minha vida? Não tem nada aqui. É tudo minha imaginação. Então a luz do quarto pisca, como anunciando que em breve falhará. Alguém destranca a porta. Mas como… como, porra!? A chave está comigo!! Corro e tranco novamente. E pela segunda vez o trinco é liberado sozinho. Tranco novamente e me afasto alguns passos para trás, tremendo de pavor. Dessa vez além de destrancar deliberadamente, a chave, que deixei fincada na fechadura, cai e a porta é aberta alguns pequenos centímetros. Meu deus, o que é aquilo escorrendo para dentro do quarto? Meu coração para e sinto novamente algo tocando minhas costas. Me viro muito rápido e no movimento de minha cabeça vejo pelo reflexo do espelho que há alguma coisa se movendo dento do quarto. Um vulto. Mas onde? Pra onde foi? Alguma coisa se esgueira pela fresta da porta em direção ao interruptor. Breu. Não sei mais para onde apontar a arma. Giro de um lado para o outro sem enxergar nada. Novamente algo toca minhas costas. Outra vez. E outra. Começo a gritar e disparar a esmo pelo quarto. A pólvora estourando como flash de um fotógrafo revela que o quarto está totalmente tomado por uma legião de figuras disformes semi humanoides. Só tenho mais 4 balas. Disparo e vejo eles se aproximando. Mas eu acertei o alvo! Como podem ainda estar se movendo? Disparo novamente e vejo que estão a minha volta. Mais uma vez e já estão sobre mim. Vieram me buscar. Sinto mãos me segurando. Não tenho saída. O último disparo é o que me libertará. Encaixo a arma dentro da minha própria boca e aperto o gatilho. Não me levarão. Eu não estava sozinho afinal.